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Qual a ligação dos programas automotivos do Governo e o Aftermarket automotivo?
Bilhões de reais e milhares de empregos podem sumir nos próximos anos
Artigo de Luiz Sergio Alvarenga – Alvarenga Projetos Automotivos Ltda
Uma reflexão sobre um breve registro histórico abaixo vai deixar o leitor perplexo, pois comprova o claro descaso com o aftermarket automotivo por parte das autoridades brasileiras desde sempre, situação completamente diferente nos continentes desenvolvidos como Estados Unidos e Europa.
1956
O Decreto Federal nº 39.412 de 16/06/1956 assinado pelo Presidente da República Juscelino Kubitschek de Oliveira criava o GEIA – Grupo Executivo para a Indústria Automotiva, tomava uma série de medidas para convencer as montadoras de automóveis a instalarem filiais no Brasil, como a restrição de importações, instalarem fábricas no país, montar os carros com um percentual elevado de peças produzidas no Brasil e incentivos financeiros e fiscais, sinalizando futuramente para o aftermarket que o mercado estava sendo criado no país.
Nota-se claramente que o plano de industrializar o Brasil daquela época com base no setor automobilístico consolidado nos países de suas matrizes, era através de suas filiais.
No artigo abaixo era moldada a indústria de autopeças brasileira que posteriormente incrementaria o canal independente do Aftermarket.
“Art. 6º Na medida em que se forem desenvolvendo os programas de fabricação de veículos e suas peças no país, os órgãos competentes promoverão revisões do tratamento reservado aos respectivos produtos, para estabelecimento de condições menos favoráveis à sua importação, revogando inclusive as facilidades já concedias às atividades de montagem de tais veículos.”
No artigo abaixo o governo já dava sinais de fortalecer as multinacionais no país.
“Art. 12. Os incentivos reservados à indústria automobilística serão preferentemente dirigidos aos projetos de iniciativa privada, abstendo-se o Governo de estimular a instituição de novas entidades estatais, dedicadas às atividades similares.”
FROTA EM 1960 = 286.043
1972
O Decreto-Lei nº 1.219 de 15/05/1972 assinado pelo Presidente da República Emilio Garrastazu Médici criava uma política de estímulo as exportações de produtos manufaturados no Brasil, então as filiais das montadoras instaladas aqui lançavam veículos criados no exterior e adaptados ao mercado brasileiro. Neste período a reparação de veículos já existia desde as importações de veículos e algumas se transformaram em grandes indústrias de autopeças nacionais.
No artigo abaixo já é notório o que viria pela frente e que persiste até hoje nos programas automotivos de governo, de políticas de benefício fiscal que acabam de uma forma ou de outra canalizadas mais para multinacionais.
“Art. 1º As empresas fabricantes de produtos manufaturados que tiverem Programa Especial de Exportação gozarão, na forma deste Decreto-lei, de isenção dos impostos sobre a importação e sobre produtos industrializados bem como dos demais benefícios previstos neste Decreto-lei.”
FROTA EM 1970 = 2.418.056
1990
A Lei nº 8.032 de 12/04/1990 assinada pelo Presidente da República Fernando Collor de Melo abria o mercado brasileiro, estimulando a importação e fazendo com que o Brasil ingressasse na competição global. Todos devem lembrar e os mais jovens podem pesquisar, mas a marca de veículos automotores russa chamada Lada surpreendeu de forma tortuosa sua entrada no país, mas rapidamente as marcas aqui instaladas iniciaram a contraofensiva e entramos no eixo. Neste período o setor de reparação de veículos sofreu seu primeiro impacto com o ingresso da tecnologia da injeção eletrônica, tecnologia já conhecida de nossos vizinhos Argentina e Uruguai, mas que atingiu tanto os profissionais do setor como o corpo docente de instituições de ensino profissionalizante, que tiveram que acelerar o processo de modernização das escolas e de conteúdos programáticos de seus cursos. Nesta década o Sindirepa juntamente com o Senai formou o primeiro grupo de profissionais e docentes para participar do curso de Autotrônica na University of South Florida, cujo reitor já alertava “os veículos que estão sendo produzidos hoje, só daqui a 5 anos terão condições de serem absorvidos totalmente pelo ser humano para entendimento e manutenção adequada”.
Para o Aftermarket este momento possibilitou de forma indireta algumas dificuldades como o impacto tecnológico, mas também oportunidades de novos conhecimentos e atender assim a frota circulante que vinha em processo de crescimento.
Os artigos neste caso são desnecessários pois mesmo tendo impactado fortemente o setor automotivo, vários outros setores também o foram, mas entendemos que em nenhum momento houve algo que contempla-se o aftermarket automotivo, apenas abria-se o mercado e o mercado interno teria que se adaptar sem um prazo para isto.
Neste mesmo período o Decreto nº 99.349 de 27/06/1990 foi publicado, mas já com influência daquele que seria o futuro Presidente da República Itamar Franco e que retomava mais uma vez a política de incentivo fiscal, beneficiando as montadoras de veículos instaladas no Brasil com redução de IPI.
No artigo abaixo iniciava a era dos veículos de 1.000 cilindradas, e mais uma vez nada se tratava sobre o aftermarket automotivo.
“Art. 1º Fica reduzida para 20% (vinte por cento) a alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados incidente sobre os automóveis de passageiros, veículos de uso misto e outros veículos automóveis principalmente concebidos para transporte de pessoas, com motor de pistão alternativo, de ignição por centelha (faísca) e cilindrada não superior a 1.000cm³ (mil centímetros cúbicos), classificados no código 8703.21.9900 da Tabela de Incidência aprovada pelo Decreto nº 97.410, de 23 de dezembro de 1988, com as alterações decorrentes das modificações efetuadas na Nomenclatura Brasileira de Mercadorias pela Resolução nº 77, de 12 de dezembro de 1988, do Comitê Brasileiro de Nomenclatura.”
FROTA EM 1990 = 12.806.303
1997
O Decreto nº 2.179 de 18/03/1997 assinado pelo Presidente da República Fernando Henrique Cardoso mais uma vez continuava com a política de incentivo fiscal para desenvolvimento regional, com os compromissos de aumento da nacionalização de componentes e exportação de parte da produção, e o aftermarket automotivo surgia, porém, totalmente voltado as montadoras e indústrias de autopeças
No artigo abaixo comprova-se o benefício para as montadoras e indústrias de autopeças, valendo destacar que em outros artigos da lei ainda se dava o benefício de importação. O aftermarket automotivo do ponto de vista de controle da frota através da Inspeção Técnica de Veículos era negligenciado, o fim de vida útil dos veículos nem se falava, a qualidade de componentes dava um suspiro com a certificação, mas que acabou não disseminando para todo o conjunto de componentes anos depois. Enquanto isso não se tratava de benefícios ao comércio de autopeças e reparação de veículos.
“Art. 1º Este Decreto regulamenta a redução de impostos prevista na Lei nº 9.440, de 14 de março de 1997, incidente sobre:”
“II – Matérias-primas, partes, peças, componentes, conjuntos e subconjuntos, acabados e semiacabados, e pneumáticos;”
2012
A Lei Federal nº 12.715 de 17/09/2012 assinada pela Presidente da República Dilma Roussef, uma legislação bem confusa do ponto de vista de conteúdo legislativo, mas dava início a era dos programas automotivos nominados, iniciando com o INOVAR AUTO, também com benefícios fiscais, e que tratava de eficiência energética, etiquetagem veicular e segurança. Vale destacar que, quando lemos aqui “segurança”, na verdade está relacionada a tecnologia incorporada nos veículos automotores, e não a segurança geral que seria a ITV – Inspeção Técnica Veicular. Estas tecnologias sem dúvida são extremamente importantes, mas mais uma vez o Governo dá o benefício fiscal as montadoras de veículos e grandes corporações automotivas e não enxerga o impacto de tais medidas no aftermarket. Apenas citando algumas, como o mecânico deveria fazer para trabalhar nestas tecnologias? A informação era liberada? E o comércio tinha se preparado para tais novos componentes? Tinha acesso no mercado de reposição?
No artigo abaixo fica claro não se tratar dos veículos em circulação e com tecnologias defasadas em relação a nova proposta, o que vai colocando o mercado de reposição na condição do “sapo quente na panela”, ou seja, sendo levado a crer na evolução tecnológica, porém, sentindo os impactos que futuramente abriria os precedentes para entrantes oportunistas e mesmo o crime organizado.
“Art. 40. Fica criado o Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica e Adensamento da Cadeia Produtiva de Veículos Automotores – INOVAR-AUTO com objetivo de apoiar o desenvolvimento tecnológico, a inovação, a segurança, a proteção ao meio ambiente, a eficiência energética e a qualidade dos automóveis, caminhões, ônibus e autopeças”
2018
A Lei federal nº 13.755 de 10/12/2018 assinada pelo Presidente da República Jair Messias Bolsonaro dava continuidade aos mesmos programas do passado com benefícios fiscais e o nome do programa passava a chamar ROTA 2030 que dava continuidade a itens do programa anterior e já começava a tratar de matriz energética com novos propulsores sem ser a combustão, falava-se em capacitação técnica e da qualificação profissional no setor de mobilidade e logística, o que seria isto? , mas continuava abstendo o aftermarket automotivo, um verdadeiro absurdo, visto que a certificação compulsória de componentes já existia, assim como a certificação de oficinas .
No artigo abaixo reparem a capciosidade, pois já não trata da similaridade, mas da capacidade de produção, o que daria uma vantagem fenomenal as montadoras e fornecedores globais.
“Art. 20. Fica instituído o regime tributário para a importação das partes, peças, componentes, conjuntos e subconjuntos, acabados e semiacabados, e pneumáticos, sem capacidade de produção nacional equivalente, todos novos.”
FROTA EM 2000 = 20.808.972
2023
A Medida Provisória nº 1.205 de 30/12/2023 assinada pelo Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva , mas recente programa automotivo chamado agora MOVER novamente repete a fórmula que iniciou em 1972, pois vamos desconsiderar aqui a era Juscelino, devido ser o ingresso da indústria automobilística no país, onde talvez uma frase atribuída a Albert Eistein faça sentido “Insanidade é continuar fazendo as mesmas coisas e esperar resultados diferentes”, de benefícios fiscais, e afasta ainda mais o aftermarket automotivo pois o objetivo é aumentar a competitividade global, mas não enxerga o mercado doméstico, e foca principalmente na bandeira da descarbonização, que certamente é válida, mas novamente, como ficam os veículos em uso da frota circulante no país em relação as emissões? Por que se acaba um programa de excelência que existia no município de São Paulo de controle de emissões onde a mentalidade de manutenção preventiva ganhava forma na sociedade? ou seja, miram o vidro dianteiro e esquecem o retrovisor.
No artigo abaixo vão notar um inciso interessante e que talvez devesse ser explorado, pois uma montadora já largou na frente e já oferece componentes de alto valor agregado na forma remanufaturada e com isto atende a exigência da lei e deve se beneficiar com ela, nada ilegal, pelo contrário justo e inteligente, a pergunta que fica é, como ficam as peças que hoje já são “remanufaturadas” se podemos chamar assim que são comercializadas em plataformas de marketplace sem qualquer critério ou atendendo legislação específica? E os componentes novos que são obrigados a realizarem fortes investimentos para obterem o certificado Inmetro, existe algum controle sobre a comercialização dos mesmos sem o selo Inmetro?
Art. 2º O Poder Executivo federal estabelecerá requisitos obrigatórios para a comercialização de veículos novos produzidos no País e para a importação de veículos novos classificados nos códigos 87.01 a 87.05 da Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – TIPI, aprovada pelo Decreto nº 11.158, de 29 de julho de 2022, relativos a:
II – Reciclabilidade veicular;
Por fim, fica então uma boa reflexão histórica do ponto de vista do Aftermarket Automotivo para irmos criando a consciência de saber aproveitar melhor legislações como estas, desde que estejamos inseridas nela.